Denúncias de abuso infantil na internet dobram em uma semana após vídeo de Felca
Após a publicação do vídeo “Adultização” do youtuber Felca, denúncias de exploração sexual infantil na internet crescem 114%.
A divulgação de um vídeo pelo youtuber Felca, na última quinta-feira (6), provocou uma reação em cadeia que ainda reverbera nas estatísticas. Em apenas uma semana, a Safernet — ONG que atua na defesa dos direitos humanos na internet — registrou um aumento de 114% nas denúncias de imagens de abuso sexual infantil. Foram 1.651 ocorrências até esta terça-feira (12), contra 770 no mesmo período do ano passado.
O vídeo, intitulado “Adultização”, já ultrapassou 34 milhões de visualizações e serviu de catalisador para mais de 30 projetos de lei na Câmara dos Deputados. Nele, Felca expõe como criadores de conteúdo exploram sexualmente imagens e vídeos de crianças e adolescentes para obter lucro em redes sociais, muitas vezes sob disfarces sutis que escapam da moderação das plataformas.
Segundo a Safernet, os problemas abordados pelo influenciador não são novidade. Desde o ano passado, a ONG denuncia o uso de aplicativos de mensagens, especialmente o Telegram, como canais de distribuição e venda de material ilegal. Criminosos também utilizam siglas, acrônimos e até emojis para ocultar pedidos de conteúdo, como o uso das letras “c” e “p” para se referir à pornografia infantil.

Apesar da explosão recente de registros, os dados gerais de 2024 apontavam, até então, uma queda no número de denúncias em relação a 2023 — ano com o maior volume da série histórica iniciada em 2005. No ano passado, foram 100 mil denúncias, 34% a menos que no ano anterior. Para o presidente da Safernet, Thiago Tavares, isso não significa que a internet esteja mais segura. Pelo contrário.
“Temos hoje crimes mais complexos e graves. A queda das denúncias está relacionada à dificuldade crescente de monitoramento, especialmente com o uso de inteligência artificial para criar imagens falsas e à migração dos criminosos para aplicativos menos fiscalizados”, afirma Tavares. Ele ressalta que conteúdos ilícitos circulam por meio de links divulgados no X (antigo Twitter) e no Instagram, mas que direcionam o usuário para canais privados em apps de mensagens, dificultando o rastreamento e a remoção.
As autoridades brasileiras têm intensificado a repressão. Em 2023, a Polícia Federal realizou mais de mil operações contra abuso sexual infantil — mais que o dobro das 502 registradas em 2022. Ainda assim, especialistas alertam que a velocidade com que novas tecnologias são incorporadas ao crime exige mudanças urgentes nas políticas de segurança digital.
Enquanto isso, o vídeo de Felca segue mobilizando usuários, legisladores e entidades. E, se por um lado ele revelou uma face sombria da internet, por outro, mostrou que a pressão popular ainda é capaz de transformar indignação em ação concreta.